3. O Princípio da Equivalência

Primeiros passos

No entanto, a descrição da gravidade proposta dois séculos antes por Newton se tornou inconsistente com o novo paradigma introduzido pela Teoria da Relatividade Restrita, desenvolvida por Einstein em 1905. Como vimos anteriormente, a lei da gravitação universal de Newton estabelece que a força gravitacional é inversamente proporcional à distância ao quadrado entre os corpos. Porém, como vimos na Teoria da Relatividade Restrita, essa distância depende do referencial em que estamos olhando.

A partir daquele momento, Einstein buscou desenvolver uma nova teoria para a gravidade que fosse compatível com a Relatividade Restrita. O pontapé inicial para essa nova teoria aconteceu justamente após Einstein refletir sobre a universalidade da gravitação:

A universalidade da gravitação

A gravidade é uma força muito peculiar, pois, na ausência de outras forças, ela produz a mesma aceleração nos corpos independentemente de qualquer característica dos mesmos. Essa universalidade é ilustrada no vídeo abaixo, em que uma bola de boliche e uma pena caem dentro de uma câmara de vácuo ao mesmo tempo em que um astronauta solta um martelo e uma pena na superfície da lua!

Como o experimento acontece em uma câmara de vácuo, não há outras forças atuando sobre esses objetos além da força gravitacional. Logo, aplicando a Segunda Lei de Newton, nós temos que:

Em que:

Nessas expressões, "G" é a constante gravitacional, "m" é a massa do objeto em queda, "a" é a sua aceleração, "M" é a massa da Terra, e "d" é a distância até o centro da Terra.

Substituindo esses valores na nossa primeira equação, nós ficamos com:

onde podemos cortar o "m", já que ele está presente em ambos os lados da equação. Ficamos então com:

Isso nos diz que a aceleração não depende da massa do objeto que está em queda. Por isso, a bola e a pena caem de forma igual!

Esta equivalência, apesar de interessante, não seria revolucionária se fosse aplicável apenas aos fenômenos mecânicos (já que é bem sabida desde Galileu!), mas Einstein foi além e estabeleceu que o princípio vale para todos os fenômenos naturais; portanto, vale também para a óptica e todos os fenômenos eletromagnéticos. O que nos traz uma importante consequência:

A Dilatação Temporal Gravitacional

Imagine dois relógios, A e B, que estão fixos em alturas diferentes com relação à superfície da Terra:

Vamos ver como um observador C em queda livre (para o qual valem as regras da Relatividade Restrita!) compara o tempo medido por A e B.

Quando C passa por A, A está se movendo com relação a C. Portanto, sabemos da Relatividade Restrita que C perceberá o relógio de A batendo mais lentamente que o seu.

Mas, uma vez que C está em queda livre, quando alcança B, B tem uma velocidade ainda maior com relação a C; portanto, C conclui que o tempo de B passa de forma ainda mais lenta que o tempo de A.

Isso implica que quanto mais próximo da fonte do campo gravitacional, mais devagar o tempo passa!

O que finalmente explica o evento que vimos no filme Interestelar! Como o planeta em que eles pousaram estava muito próximo de Gargantua, que era uma fonte de campo gravitacional muito intensa, o tempo para eles se passou de forma muito mais devagar do que para o colega deles que ficou esperando na espaçonave!

O GPS (Sistema de Posicionamento Global) consiste de um conjunto de 24 satélites com órbitas de cerca de 12h ao redor da Terra. Cada satélite tem a bordo relógios atômicos muito precisos.

Periodicamente, esses satélites enviam sinais que carregam informações sobre a sua posição e o tempo marcado em seus relógios no instante da emissão do sinal. Um observador, que recebe essa informação de múltiplos satélites, consegue calcular a sua posição com base nas informações recebidas.

Para isso ele tem que levar em consideração duas correções vindas da Relatividade: A primeira vem do fato de o satélite estar se movendo com relação ao observador, e a Relatividade Restrita implica que o tempo para o satélite vai se passar de forma mais lenta do que para o observador. A segunda correção vem da dilatação temporal gravitacional que vimos acima: Como o satélite está em uma altura maior do que o observador, o tempo para ele passará mais rápido.

Se essas correções relativísticas não fossem levadas em conta, levaria alguns minutos para acumular um erro suficiente para impedir qualquer aplicação funcional do GPS. Como, por exemplo, o nosso encontro com o motorista do Uber!

Sabemos que a Lei de Gravitação Universal de Newton só é válida para corpos com massa e, portanto, segundo ela, a luz, que não tem massa, não deveria sofrer a ação da gravidade. Mas o que será que o Princípio da Equivalência que acabamos de ver nos diz sobre isso?

Imagine que um raio de luz entre em uma torre horizontalmente através de uma janela, e depois atinja a parede oposta, tudo num tempo muito curto. O princípio da equivalência nos diz que em um refencial em queda livre, a luz deve se comportar da mesma forma que faria na ausência de gravidade, ou seja, deve viajar em linha reta. No entanto, o que é visto como movimento em linha reta para um observador em queda livre deve ser visto como uma trajetória curva por um observador que se encontra parado dentro da torre.

Isso nos diz que, diferente da gravitação Newtoniana, em que somente corpos com massa eram afetados pela gravidade, aqui, até mesmo a luz, que não tem massa, está sujeita a ela!

O desvio da luz pela gravidade, inclusive, foi a primeira consequência da Teoria da Relatividade Geral a ser comprovada! Em 1919, apenas três anos após a descoberta de Einstein, duas equipes foram enviadas para diferentes locais para observar um eclipse solar (sendo um desses locais, inclusive, em Sobral, aqui no Brasil!). O objetivo era fotografar as estrelas que apareciam no céu próximas ao Sol e compará-las a fotografias destas mesmas estrelas sem a interferência do Sol, pois, se a teoria estivesse correta, o campo gravitacional do Sol desviaria a trajetória da luz que elas emitiam, e por conta disso, elas apareceriam em outra posição no céu! Essa diferença foi de fato comprovada e a partir daí a teoria de Einstein ganhou mais força!

De forma geral, esse efeito é muito importante na Astronomia, pois ele se faz presente em diversas observações astronômicas, como nesta foto de espaço profundo tirada pelo Telescópio James Webb em 2022, em que pode-se ver que galáxias próximas ao centro tem sua aparência deformada graças à grande massa das galáxias mais ao centro.